¦3 *Comendo arsênico*
Louvada seja, Madame Bovary !
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Que noite indolente, a lua preguiçosamente observava a quietude dos becos e vielas das pequenas cidades, seus habitantes há muito se encontravam recolhidos, nas ruas apenas vagavam ermos os ébrios e os desajustados; no campo uma fácula de luz irradiada pela lua iluminava parcamente os vinhedos os pequenos jardins das propriedades e as grandes extensões de lavoura que exalavam odor de sofrido labor; era uma noite cálida e nada de extraordinário parecia estar acontecendo. No céu, algumas nuvens estavam espalhadas, e o brilho pálido que se refletia no cândido e prateado espelho que ornamenta o céu noturno dava a este um aspecto solene e funesto.
Os narizes de ambos quase se tocavam, as bocas estavam retorcidas e tesas, a senhorita mantinha as mãos virtuosamente postas sobre as coxas e sentia que inconscientemente apertava o tecido de seu frágil vestido fazendo-o se enrugar, os dedos trêmulos e o fito nas sobrancelhas e nos olhos dolentes do rapaz a sua frente, escorriam-lhe pela fronte algumas gotas de suor e o seu peito arfava de ansiedade.
Podiam ambos sentir a respiração um do outro acariciar doce e lentamente suas bochechas, a suavidade e a calidez da sensação os deixavam arrepiados; o jovem rapaz mordia o lábio inferior e nele pressionava os dentes com tanta força que chegava a gravar-lhe pequenas manchas rubras, ao vislumbrar a cena a senhorita contorcia-se intimamente desejando agarrar-lhe o pescoço e dizer-lhe loucuras.(não o fazia graças ao pouco pudor que lhe restava).
Subitamente, seguido de um susto e posteriormente o alívio uma das mãos percorre a infinita e inalcançável distância que parecia aprisiona-los em universos distintos, o gesto recíproco e o rubor imediato, ambos sorriam e os rostos apenas não fundiam-se em um só por ser humanamente impossível. Os lábios do rapaz, grandes e bem desenhados eram suaves como um botão de rosa quando deslizando pela pele casta daquela jovem donzela, os dela projetavam-se diagonalmente e de forma sedutora quando aspirava o ar com mais força para conter as concupiscências que vaguejavam por sua alma reprimida, que libertava-se da peia a que sempre estivera submissa. Em um instante milênios esvaíram-se pelos portões do infinito e era insopitável o desejo de ambos. ”Da-mo, o beijo. Com ternura ou lascívia, pousa teus lábios nos meus e deixa-me agasalhar-lhe a boca pela eternidade do efêmero.”Projetam-se os lábios e permeados por brumosas sensações. Mantinham os olhos cemi-cerrados desejando entregarem-se por completo mas, receando a perda da experimentação do empírico, a concretização das aspirações e o momento sublime, o eflúvio dos sentimentos para realização do inefável, enfim.
O beijo.
Ri-se da própria perspicácia Pantaleão, dito e feito! Ah! Colombina... !
Um sonoro ruído de desastre,e esparramado no chão está o pobre pantaleão, o vento uiva em seus ouvidos como uma platéia faz escárnio de um medíocre ator, for fim, os cotovelos escorregaram.
Não se despede, pois está desmaiado.